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Perspectivas

Subvariante BA.2 impulsiona novo surto global da pandemia

Publicado originalmente em 9 de março de 2022

Enquanto o aprofundamento da guerra na Ucrânia ameaça escalar para um confronto direto entre as potências dos EUA e da OTAN e a Rússia, existe uma outra escalada, da pandemia de COVID-19, quase completamente não noticiada. Essas duas crises globais interligadas estão lançando a humanidade em uma catástrofe.

Hoje, a região mais significativa da pandemia é Hong Kong, onde as taxas de infecções e mortes per capita são muito maiores do que todos os surtos anteriores em todos os países do mundo. Logo após as infecções terem saído do controle em meados de fevereiro, os hospitais e depois os necrotérios ultrapassaram os limites de capacidade, com a população idosa, relativamente menos vacinada, afetada mais severamente.

Na segunda-feira, a média móvel de 7 dias de novas mortes diárias por milhão de pessoas em Hong Kong chegou a 29,18. Isso é mais de 50% superior ao pico de 18,31 atingido no Reino Unido em 23 de janeiro de 2021, quase o triplo do pico dos Estados Unidos de 10,22 em 13 de janeiro de 2021, e maior que o recorde mundial anterior de 26,2 estabelecido no Peru em 23 de abril de 2021. As mortes por COVID-19 em Hong Kong continuam aumentando exponencialmente e podem ultrapassar 50 por milhão de pessoas nos próximos dias.

Significativamente, a subvariante BA.2 da Ômicron, com uma mutação I1221T na proteína S, é responsável por 100% das infecções sequenciadas em Hong Kong. A cidade sinaliza a próxima etapa da pandemia, na qual se prevê que a subvariante BA.2 irá se tornar predominante em todo o mundo.

Assim como a propagação global da subvariante BA.1 da Ômicron em dezembro passado, a reabertura total da economia mundial está fazendo com que a BA.2 se espalhe rapidamente a nível internacional. Ao contrário da narrativa veiculada pela mídia corporativa de que a COVID-19 é hoje “endêmica” e um “novo normal” estável foi atingido, a realidade se impôs mais uma vez no terceiro ano dessa crise sem precedentes.

Apenas 37 dias após as infecções globais oficiais atingirem um pico de 3,44 milhões em 24 de janeiro de 2022, a queda parou abruptamente em 1,48 milhão em 2 de março e está aumentando novamente de forma constante, marcando o início do novo surto global da pandemia.

A BA.2 é responsável por mais de um terço de todas as infecções sequenciadas em todo o mundo e está impulsionando a nova onda da pandemia. A BA.2 é hoje a variante dominante em 34 dos 75 países que estão sendo monitorados pelo site covariants.org. Ela é responsável por pelo menos 40% das infecções em sete dos 10 países com o maior número de casos diários: Vietnã (42%), Alemanha (63%), Rússia (41%), Holanda (53%), Reino Unido (57%), Áustria (40%) e Malásia (73%).

Após semanas de declínio, as hospitalizações na Inglaterra cresceram acentuadamente em 15,6% na semana passada em todas as faixas etárias, com um intenso aumento de 26% entre as crianças de seis a 17 anos. Nos Estados Unidos, a BA.2 está crescendo exponencialmente, com o nordeste do país vivenciando o crescimento mais acelerado.

O cientista Yaneer Bar-Yam, co-fundador da World Health Network (WHN, Rede Mundial de Saúde), uma coalizão global de cientistas e grupos comunitários que defendem uma política de eliminação da COVID-19 em todo o mundo, conversou recentemente com o World Socialist Web Site. Resumindo os resultados de um importante estudo da Universidade de Tóquio sobre a BA.2, ele observou que a “BA.2 transmite 40% mais rápido do que BA.1” e “tem maior escape vacinal do que a BA.1”. Ele acrescentou que a BA.2 “é muito mais grave” que a BA.1 e “a infecção pela BA.2 é resistente à infecção prévia pela BA.1”.

O Dr. Bar-Yam concluiu que a “BA.2 é suficientemente diferente da BA.1 para que lhe seja dada sua própria designação ‒ sua própria letra grega ‒ de acordo com o esquema de numeração atual. Porém, isso não é politicamente muito confortável, porque estão declarando que isso acabou e ter uma nova letra grega levantaria questões que exigem que reavaliemos o que está acontecendo”.

Pacientes em camas de hospital em uma área de espera fora do Centro Médico Caritas em Hong Kong no dia 2 de março de 2022. (AP Photo/Kin Cheung)

De fato, a rápida propagação da subvariante BA.2, mais infecciosa, agressiva e resistente à vacina, ocorre em condições nas quais quase todos os países, exceto a China, eliminaram todas as medidas de mitigação restantes para retardar a propagação da COVID-19. A miopia e a estupidez desses esforços estão hoje completamente expostos.

Nos EUA, esse processo foi liderado pela administração Biden e pelo coordenador de resposta à COVID-19 da Casa Branca, Jeff Zients, um multimilionário que acumulou entre US$ 10,4 milhões e US$ 28 milhões somente em 2020 após o resgate de Wall Street pela lei CARES.

Entre aqueles trabalhando com a Casa Branca está Ezekiel Emanuel, ex-assessor de Biden e Barack Obama, co-autor de um artigo publicado em 6 de janeiro de 2022, intitulado “A estratégia nacional pelo ‘novo normal’ da vida com a COVID”. No domingo, uma elaboração de 136 páginas desse artigo foi publicada sob o título “Alcançando e sustentando o próximo normal: Um roteiro para viver com a COVID”.

Emanuel, um defensor de longa data da diminuição da expectativa de vida e da redução dos gastos com a saúde, foi descrito como um “eugenista” pelos defensores dos direitos da pessoa com deficiência. O seu plano, mais apropriadamente intitulado “Um roteiro para o desastre”, aceita ondas intermináveis de infecções e mortes e a debilitação de longo prazo por esse vírus evitável, o qual, ele argumenta, deveria se tornar uma característica permanente da sociedade.

Fornecendo uma justificativa pseudocientífica para acabar com todos os testes e o rastreamento de contatos para COVID-19, o “roteiro” de Emanuel é a antítese da estratégia de “dinâmica zero” implementada na China, que tem eliminado repetidos surtos e reduzido as mortes a apenas duas pessoas desde maio de 2020 ‒ em um país com uma população de 1,4 bilhão.

A própria evolução da Ômicron e suas subvariantes BA.1 e BA.2 é o produto da resposta capitalista à pandemia, que subordinou a saúde pública aos interesses da elite dominante. Ao se recusar a implementar as medidas necessárias para conter e finalmente eliminar o vírus em cada país, a classe dominante gerou os monstros de Frankenstein, Alfa, Beta, Gama, Delta e agora Ômicron, cada um pior que o seu predecessor.

As consequências a longo prazo dessas políticas socialmente criminosas são incalculáveis. Cada estudo sobre a COVID longa reafirma o terrível caráter dessa doença e a necessidade da sua eliminação em todo o mundo. O mais recente e talvez o mais alarmante é um estudo com dados de imagem do Biobank britânico publicado recentemente na Nature, constatando que os participantes com infecções leves possuíam lesões no tecido cerebral cinco meses após suas infecções. Os danos correspondiam a uma década de envelhecimento. Os pesquisadores especularam que a demência e a perda de memória podem ser desenvolvimentos a longo prazo de uma parte das infecções por COVID-19.

Hoje, está muito claro que as atuais vacinas limitam a probabilidade de morte, mas não impedem infecções, doenças graves ou a morte, tornando a abordagem “somente vacina” não científica e inviável. Devido ao caráter implacável da evolução viral, enquanto o vírus se espalhar e infectar milhões de hospedeiros ao redor do mundo, novas variantes potencialmente mais resistentes à vacina, contagiosas e agressivas irão continuar surgindo.

O surgimento do BA.2 refuta fundamentalmente todas as afirmações de que a COVID-19 irá evoluir para um vírus mais leve, semelhante à gripe ou ao resfriado comum. Essas declarações sempre foram feitas para desarmar uma classe trabalhadora cada vez mais militante e traumatizada pela devastação da pandemia.

A próxima sexta-feira, 11 de março, marcará dois anos desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou oficialmente o surto de COVID-19 como uma pandemia. Em apenas dois anos, aproximadamente 20 milhões de pessoas morreram direta ou indiretamente por COVID-19, de acordo com um rastreador de “mortes em excesso” publicado pelo The Economist. Isso inclui a estimativa do verdadeiro número de mortes de 1,2 milhão nos EUA, 1,2 milhão na Rússia, 220 mil na Ucrânia, 150 mil no Reino Unido e 120 mil na Alemanha.

Tendo cometido um sociocídio através das estratégias de “imunidade de rebanho” e “somente vacina” implementadas nos últimos dois anos, as elites dominantes nos EUA e em toda a Europa têm se preparado para crimes ainda maiores em uma potencial Terceira Guerra Mundial com a Rússia, detentora de armas nucleares.

A guerra em si, que começou no auge do surto da Ômicron na Ucrânia e na Rússia, irá exacerbar enormemente a propagação da COVID-19. Mais de 2 milhões de refugiados ucranianos fugiram do país em trens e metrôs superlotados, criando um super evento de espalhamento. As despesas com serviços sociais serão cortadas ainda mais e direcionadas para os orçamentos militares de cada país.

Tanto na resposta à pandemia quanto no conflito com a Rússia em torno da Ucrânia, a classe dominante procedeu com extraordinária imprudência. Porém, é uma imprudência enraizada em interesses de classe. De fato, um dos objetivos centrais da histérica propaganda de guerra, sobretudo nos EUA, é distrair a atenção da pandemia.

A mídia capitalista opera sob a ilusão de que, se ela não informa sobre a pandemia, ela não existe. Porém, a pandemia teve e continua tendo conseqüências catastróficas para a grande maioria da população.

A tarefa mais crítica é construir um movimento massivo unificado da classe trabalhadora internacional para interromper a marcha à Terceira Guerra Mundial e iniciar uma guerra global contra a COVID-19.

Em sua entrevista com o WSWS, o Dr. Bar-Yam enfatizou: “É mais fácil fazer a eliminação hoje do que anteriormente. A tecnologia está melhorando. Nosso entendimento tem crescido exponencialmente”.

Ele acrescentou: “Devemos simplesmente decidir fazer isso, e então estaremos em muito melhores condições”.

Somente através da aplicação combinada de todas as medidas de saúde pública disponíveis em escala mundial, a COVID-19 será eliminada e a pandemia irá acabar. Na sua base, isso requer uma luta direta contra o sistema capitalista e o estabelecimento de uma sociedade socialista mundial para pôr fim à guerra e às mortes desnecessárias por doenças evitáveis e iniciar o desenvolvimento da cultura humana com base na igualdade social.

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