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Perspectivas

Em convenção da AFL-CIO, Biden procura sindicatos para impor programa de austeridade e guerra

Publicado originalmente em 15 de junho de 2022

Na terça-feira, o presidente Joe Biden deu o principal discurso na convenção constitucional da Federação Americana do Trabalho ‒ Congresso de Organizações Industriais(AFL-CIO) na Filadélfia. Os comentários de Biden, que se autodenominou “o presidente mais pró-sindicato da história americana”, expressaram a confiança de sua administração no aparato sindical para vencer a resistência da classe trabalhadora ao aumento da inflação e aos custos das guerras em expansão com a Rússia e a China.

Essa é uma difícil tarefa para o conjunto de agentes pró-empresariais, mercenários do Partido Democrata e inimigos da classe trabalhadora que se reuniram na Filadélfia esta semana. Após décadas de traições pelos sindicatos da AFL-CIO, a maioria dos trabalhadores nos Estados Unidos não fazia idéia de que a convenção estava acontecendo e pouco se importava.

A filiação aos sindicatos continuou diminuindo no ano passado, caindo para 14 milhões com a saída de outros 240 mil trabalhadores. Apenas 10,3% dos trabalhadores nos EUA eram sindicalizados em 2021, incluindo apenas 6,1% no setor privado e 4,2% dos trabalhadores com 24 anos de idade ou menos. Em um sentido muito real, os sindicatos devem sua existência ao financiamento que recebem de uma seção das grandes empresas e do Estado capitalista.

O objetivo de seu governo, disse Biden aos funcionários da AFL-CIO, é “incentivar os sindicatos” e “facilitar a organização dos trabalhadores”. Biden declarou que seu programa de infraestrutura e apoio às “parcerias sindicais” fortaleceria os sindicatos. “Não estou dizendo isso apenas para ser pró-sindicatos. Estou dizendo isso porque sou pró-americano”.

Biden aludiu aos perigos da militância crescente da classe trabalhadora e à necessidade dos sindicatos reprimirem a luta de classes. “Você sabem que, se os banqueiros de investimentos nos EUA ‒ eles não são todos maus... se eles entrassem em greve, não aconteceria muita coisa. ... Se a IBEW [Irmandade Internacional de Trabalhadores Elétricos] entrasse em greve, tudo fecharia”. Ele acrescentou: “Acho que vocês não percebem a importância crítica que possuem. Não estou tentando ser gentil com vocês; é apenas um fato”.

De fato, o sindicato de professores nacional (AFT), o sindicato de trabalhadores automotivos (UAW), do setor de alimentos e serviços (UFCW), de metalúrgicos (USW) e outros sindicatos da AFL-CIO têm sido fundamentais para forçar os trabalhadores a entrar em escolas, fábricas e outros locais de trabalho infectados durante toda a pandemia. Isso custou a vida de milhares, se não dezenas de milhares de membros de sindicatos que contraíram a COVID-19 em escolas, fábricas, centros de transporte público e de carga e outros locais de trabalho.

Biden se gabou: “Reduzimos em 90% as mortes por COVID. Abrimos escolas e empresas que foram fechadas. Tudo isso criou a maior recuperação de empregos da história americana”.

Ele não estava com medo de ser contrariado por esses executivos sindicais, que estão protegidos dos resultados desastrosos de suas ações. Na verdade, Biden supervisionou mais mortes (595 mil) em seu tempo no cargo do que Trump (441 mil). Apesar dos maiores esforços da Casa Branca para declarar o fim da pandemia e ocultar o número real de infecções e mortes, novas variantes do vírus mortal estão se espalhando pelos locais de trabalho e bairros.

Quanto ao suposto paraíso econômico para os trabalhadores, a maior taxa de inflação em 40 anos está corroendo os salários dos trabalhadores e impedindo pagar as despesas de subsistência. Ao mesmo tempo, o presidente do banco central (Fed) de Biden aumentou as taxas de juros em 0,75% na quarta-feira e está usando a ameaça do desemprego em massa para suprimir as demandas dos trabalhadores por aumentos salariais que acompanhem a inflação.

O presidente repetiu sua afirmação de que o aumento das despesas básicas dos trabalhadores se devia à “alta dos preços de Putin”. Porém, a inflação que afeta a economia é o produto direto dos trilhões de dólares que ambos os partidos capitalistas entregaram aos mercados financeiros desde a crise de 2008. A crise econômica foi exacerbada pelas sanções lideradas pelos EUA contra a Rússia e o armamento massivo da Ucrânia.

Biden deixou claro que precisava do apoio contínuo dos sindicatos para intensificar o confronto com a Rússia. “O que a guerra de Putin fez não é apenas tentar acabar com a cultura dos ucranianos, dizimar o povo e cometer inúmeros crimes de guerra, ela também impediu os grãos ‒ milhares de toneladas de grãos que estão trancados naqueles silos, prontos para serem exportados, mas eles não podem sair pelo Mar Negro, porque vão ser destruídos no mar”.

Ele insinuou os planos dos EUA e da OTAN de transportar os grãos por ferrovias dos portos do Mar Negro para os mercados europeu e mundial. Esses e outros planos anteriores para romper o bloqueio russo com os navios de guerra dos EUA e da OTAN só irão agravar o conflito com a Rússia, um país com armas nucleares. Em uma ligação com o presidente ucraniano na quarta-feira, Biden prometeu mais um bilhão de dólares em armamentos.

Biden sabe que irá receber apoio da AFL-CIO pelo seu belicismo, que tem apoiado todas as guerras imperialistas e golpes militares apoiados pelos EUA desde sua fundação em 1955. Isso incluiu a colaboração com nacionalistas e neonazistas ucranianos no golpe de 2014 na Ucrânia, que depôs o presidente pró-russo e transformou o país em um chamariz militar do imperialismo americano.

A primeira sessão da convenção incluiu comentários feitos pelo professor de Yale, Timothy Snyder, o principal acadêmico propagandista da guerra por procuração dos EUA-OTAN contra a Rússia. Falando da Áustria, Snyder declarou que a defesa da democracia, desde a Ucrânia aos EUA, dependia das ações dos sindicatos, que ele afirmava estarem agora “no centro da história”. Segundo Snyder, os sindicatos são os melhores exemplos de “sociedade civil”, pois são organizações que existem “entre o governo e o povo”. Além disso, os sindicatos deram ao “povo a prática de representar a si próprio” e de utilizar e defender seu “direito ao voto”.

Esses comentários foram feitos a funcionários sindicais que ignoram rotineiramente a vontade democrática de seus membros, incluindo fraudar urnas para forçar a aprovação de contratos pró-empresa.

Quanto à afirmação de que os sindicatos estão “entre o governo e o povo”, isso não é menos mentiroso. A AFL-CIO é uma subsidiária integral do Estado capitalista americano. Há muito tempo ela tem sido subsidiada da Fundação Nacional para a Democracia do Departamento de Estado dos EUA para subverter os sindicatos ao redor do mundo e proteger os interesses do imperialismo americano. A administração Biden está propondo novos subsídios e estruturas políticos para aproximar ainda mais os sindicatos das operações nacionais e estrangeiras do governo dos EUA.

Em seu trabalho de 1940, “Os Sindicatos na Época da Decadência Imperialista”, Leon Trotsky, o fundador da Quarta Internacional, apontou a tendência global dos sindicatos de se integrarem aos governos capitalistas.

O capitalismo monopolista é cada vez menos capaz de conviver com a independência dos sindicatos. Exige que a burocracia reformista e a aristocracia operária, que juntam as migalhas que caem de sua mesa, transformem-se em sua polícia política aos olhos da classe operária. Quando não consegue isso, suprime a burocracia operária, substituindo-a pelos fascistas.

Trotsky escreveu isso durante os primeiros estágios desse processo. A degeneração dos sindicatos, tornando-se ferramentas diretas do Estado, foi concluída no final dos anos 1980 e início dos anos 1990, quando, diante da globalização da produção capitalista, a AFL-CIO e os sindicatos e partidos trabalhistas de base nacional em todo o mundo abandonaram qualquer resistência à ofensiva capitalista mundial contra a classe trabalhadora. Os líderes da AFL-CIO abandonaram qualquer conversa sobre conflito de classes como uma noção antiquada e abraçaram o corporativismo, a doutrina da irrestrita colaboração de classes.

Na convenção da AFL-CIO, estava reunida uma coleção de burocratas presunçosos e autossatisfeitos, a maioria dos quais ganha salários de seis algarismos e estão muito mais preocupados com o valor no mercado de ações do que com o preço da gasolina e dos alimentos. Não havia poucos milionários na multidão, incluindo a presidente da AFT, Randi Weingarten (renda anual de quase US$ 500 mil), que, em suas próprias declarações, sequer mencionou a pandemia da COVID-19, que matou e adoeceu milhares de educadores conforme os sindicatos mantinham as escolas abertas.

A classe dominante americana está em apuros se recorrer a essas organizações corruptas e desacreditadas para conter a maré da luta de classes, que está sendo impulsionada pela crise histórica do capitalismo americano e mundial.

Nas próximas semanas e meses, centenas de milhares de trabalhadores portuários na costa oeste, trabalhadores da saúde, professores, metalúrgicos, caminhoneiros, trabalhadores de supermercados, telecomunicações e outros enfrentam lutas contratuais. Os trabalhadores estão determinados a reverter décadas de concessões apoiadas pelos sindicatos e romper o limite de aumento salarial anual de 2-4% que os sindicatos têm imposto na prática em nome das grandes empresas e do governo.

O desenvolvimento explosivo da luta de classes nos EUA ocorre no contexto de um movimento internacional de trabalhadores, incluindo, para citar apenas alguns, uma greve iminente de dezenas de milhares de trabalhadores ferroviários e outros no Reino Unido; greves de trabalhadores de linhas aéreas em toda a Europa; protestos em massa contra a austeridade e o aumento do custo de vida no Sri Lanka; e greves de trabalhadores de saúde na Turquia, Alemanha, França, Nova Zelândia e muitos outros países.

A promoção dos sindicatos por Biden surge do medo de que as organizações de base, criadas por muitas seções de trabalhadores para evitar que suas lutas sejam reprimidas e isoladas, desenvolvam-se em uma rede nacional e internacional. Isso é precisamente o que é necessário.

O Comitê Internacional da Quarta Internacional iniciou a formação da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB) no ano passado para unificar todas as diferentes lutas dos trabalhadores, entre setores e países. A construção e expansão da AOI-CB é necessária para derrotar todos os esforços dos sindicatos para sabotar as lutas da classe trabalhadora.

Os trabalhadores americanos, como seus irmãos e irmãs de classe ao redor do mundo, estão emergindo como uma poderosa força. Eles estão se voltando cada vez mais para o World Socialist Web Site e para os Partidos Socialistas pela Igualdade em todo o mundo para construir novas organizações de luta e a liderança revolucionária necessária para abolir o sistema de lucro capitalista.

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