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Lula usa intervenção imperialista na Venezuela como moeda de troca com Trump

Publicado originalmente em inglês em 12 de dezembro de 2025

Em 2 de dezembro, Lula contatou Trump por telefone para solicitar novas reduções de tarifas para exportações brasileiras e para discutir um acordo de segurança com o governo americano, que foi publicado após a ligação

Trump e Lula na Malásia. [Photo: Ricardo Stuckert/PR]

Em uma nota oficial, o governo brasileiro declarou que a chamada, que durou 40 minutos, resultou em uma “conversa muito produtiva” onde foram abordados “temas da agenda comercial, econômica e de combate ao crime organizado”. A nota detalhou: “Lula indicou ter sido muito positiva a decisão dos Estados Unidos de retirar a tarifa adicional de 40% imposta a alguns produtos brasileiros, como carne, café e frutas”, mas “Destacou que ainda há outros produtos tarifados que precisam ser discutidos”.

Essa conversação amigável entre o suposto presidente de “esquerda” e o aspirante a Führer nos EUA ocorreu conforme a administração Trump se aproxima de uma guerra em escala total contra a Venezuela.

O outro tópico oficialmente discutido foi a cooperação Brasil-EUA no “combate ao crime organizado internacional”. Nesse ponto, Lula “Destacou as recentes operações realizadas no Brasil pelo governo federal com vistas a asfixiar financeiramente o crime organizado e identificou ramificações que operam a partir do exterior”. A nota concluiu: “O presidente Trump ressaltou total disposição em trabalhar junto com o Brasil e que dará todo o apoio a iniciativas conjuntas entre os dois países para enfrentar essas organizações criminosas”.

É precisamente com o pretexto do combate ao “narcoterrorismo” que o imperialismo americano está lançando sua intervenção militar e política sem precedente não só contra a Venezuela, mas a América Latina como um todo.

Desde setembro, Trump e seu “Secretário da Guerra”, Pete Hegseth, conduziram uma campanha assassina no Caribe e no Oceano Pacífico, atacando com mísseis múltiplas embarcações civis que mataram pelo menos 87 pessoas. Essas criminosas execuções de Estado são defendidas pela administração de Trump como uma peça central da sua “guerra contra o narcoterrorismo”, apresentando fraudulentamente seus alvos como traficantes de drogas sem qualquer evidência.

Ao mesmo tempo, Trump estacionou 15 mil tropas no Mar do Caribe, a poucas centenas de quilômetros da costa venezuelana, e enviou múltiplos navios, incluindo o maior porta-aviões da frota americana, o USS Gerald Ford.

Em 29 de novembro, apenas três dias antes da ligação de Lula com Trump, o presidente americano anunciou o “fechamento completo do espaço aéreo acima e ao redor da Venezuela”. Em 10 de dezembro, uma semana após a ligação, em um ato aberto de pirataria, tropas americanas sequestraram um navio-petroleiro saindo da Venezuela. A Reuters está noticiando que a administração está se preparando para tomar outros petroleiros no que está claramente emergindo como um bloqueio do país, um ato de guerra.

Lula está plenamente ciente de que os ataques contra barcos de pesca  e a ofensiva de Trump contra Maduro e outros – como Gustavo Petro na Colômbia, que Trump declarou ser “o próximo” – não possuem qualquer relação com “combate ao narcoterrorismo”.

Em 9 de dezembro, em uma entrevista ao Guardian, Celso Amorim, um dos assessores mais próximos de Lula e ex-ministro das Relações Exteriores, classificou o fechamento do espaço aéreo venezuelano como 'um ato de guerra', comparando uma possível invasão da Venezuela à Guerra do Vietnã. Ele afirmou que 'não seria apenas uma guerra entre os EUA e a Venezuela. Acabaria tendo envolvimento global e isso seria realmente lamentável', e concluiu: 'Se ocorresse uma invasão, uma real invasão … eu penso, sem dúvida, você veria algo similar ao Vietnã – em que escala, é impossível dizer'.

Nesse contexto, enquanto busca concessões de Trump em suas ambições nacionalistas, Lula promove a ideia de que é possível buscar interesses mútuos entre os objetivos da campanha aberta de agressão do imperialismo americano e os interesses da América Latina na mesa de negociação.

Em 2 de dezembro, após a ligação entre Lula e Trump, uma fonte do Palácio do Planalto que pediu para não ser identificada disse à BBC Brasil que 'a situação dos manufaturados, especialmente, preocupa o governo'. A mesma fonte acrescentou que a ligação não teve como objetivo pressionar o governo americano, mas 'manter o assunto em pauta e avançar para reduzir ao máximo o tarifaço'.

Nas semanas que antecederam a ligação, Lula fez denúncias indiretas dos ataques no Mar do Caribe e, ao mesmo tempo, vinculou qualquer solução a uma negociação direta com Trump.

No dia 23 de novembro, durante a cúpula do G20 em Johanesburgo, Lula afirmou: “me preocupa muito o aparato militar que os EUA colocaram no Mar do Caribe e eu pretendo conversar com o presidente Trump sobre isso. É importante que a gente tente encontrar uma solução antes de começar”.

Lula está criminosamente promovendo o pretexto de Trump para sua ofensiva militar ao mesmo tempo em que amplia as forças repressivas do Estado dentro do Brasil.

O governo aprovou recentemente um orçamento específico para investimentos militares à parte da estrutura de austeridade fiscal do chamado “arcabouço fiscal”, e tem promovido uma série de iniciativas para unificar as agências policiais municipais e estaduais sob a chamada “PEC da Segurança Pública”.

Dois dias após a ligação de Lula com Trump, Fernando Haddad, ministro da Economia no Brasil, reuniu-se com autoridades americanas em Brasília. Sem mencionar a intervenção de Washington na Venezuela, ele promoveu um acordo de “combate ao crime internacional” e declarou:

Dos 100% das exportações do Brasil para os EUA, nós já estamos falando só de 22% que estão sendo afetados neste momento pelas tarifas, e eu acredito que isso aqui [acordo de segurança] é tão mais importante, tão mais eficaz que eu acredito que essa questão da Magnitsky, das tarifas, acaba se resolvendo… aos poucos nós vamos superando esse mal-entendido porque não beneficiou ninguém, só prejudicou alguns empresários.

A aceitação da chantagem tarifária do fascista americano como parte de negociações legítimas não é apenas uma expressão da impotência de Lula diante da agressão imperialista. Diante do alerta de seu assessor, Amorim, de um potencial “Vietnã latinoamericano”, as ações do governo Lula expõem seu papel como um auxiliar do imperialismo na América Latina.

Lula se manteve em silêncio em resposta ao chamado recente de Maduro, que declarou: “Povo do Brasil, saiam às ruas para apoiar a Venezuela em sua luta pela paz e soberania”. Como representante dos interesses da burguesia brasileira e do capital estrangeiro, Lula está se preparando para suprimir toda oposição em massa às iminentes guerras imperialistas contra a América Latina.

Em 11 de dezembro, recusando-se a fazer uma denúncia direta dos criminosos ataques mais recentes pelo imperialismo americano contra a Venezuela, Lula declarou em sua usual linguagem esópica: “Eu falei ao Trump, ‘nós não queremos guerra na América Latina, nós somos uma zona de paz’”.

A classe trabalhadora não pode manter qualquer ilusão de que Lula ou suas contrapartes nos governos da Maré Rosa na região irão travar uma luta contra o imperialismo na América Latina e impedir uma guerra catastrófica. Esses perigos só podem ser vencidos através de uma luta pela unificação dos trabalhadores latino-americanos com seus irmãos e irmãs nos EUA em uma luta para derrubar o capitalismo e estabelecer o socialismo internacional.

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