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Brasil enfrenta nova onda da pandemia de COVID-19 em meio a sabotagem da vacinação infantil

Acompanhando a nova onda global impulsionada pela propagação da subvariante BQ.1 da Ômicron mais infecciosa e resistente às vacinas, o Brasil está passando por sua quinta onda da pandemia de COVID-19, a terceira apenas este ano. No sábado, o país registrou uma média de 15 mil casos, um aumento de 302% em relação há duas semanas, e 37 mortes. Apesar de a média de mortes representar uma variação de – 4% em relação há duas semanas, há uma clara reversão dessa tendência, com três das cinco regiões brasileiras já apresentando um aumento na média de mortes.

Ao todo, o Brasil possui quase 35 milhões de casos e 689 mil mortes por COVID-19, o segundo maior número do mundo atrás apenas dos EUA.

Menina com uma camiseta dizendo “VACINA SIM!” recebendo a vacina contra a COVID-19 (Foto: Prefeitura de Osasco) [Photo: Osasco City Hall]

Esses números, no entanto, são enormemente subestimados. Desde o início da pandemia, o governo do presidente fascistoide Jair Bolsonaro, acompanhado por todo o establishment político brasileiro, tem feito todos os esforços possíveis para esconder a real dimensão da pandemia no Brasil com o objetivo de continuar garantindo os lucros privados.

Em junho de 2020, no auge da primeira onda e em meio ao esforço da elite dominante brasileira para reabrir a economia depois de limitados lockdowns, o governo Bolsonaro tentou censurar o número de casos e mortes acumulados do site oficial da COVID-19 do ministério da saúde, uma medida revertida pelo Supremo Tribunal Federal. Um mês depois, ele acabou com o financiamento do maior estudo epidemiológico sobre a pandemia no Brasil.

Poucas variáveis expressam tão claramente a falta de monitoramento da pandemia no Brasil quanto a testagem. Segundo o Worldometer, o país está na posição 148 de testes por um milhão de pessoas, atrás de países devastados por guerras como Líbia e Iraque. Ao mesmo tempo, dezenas de milhões de testes vencidos foram jogados fora repetidas vezes.

Durante a onda da Ômicron BA.1, em dezembro do ano passado, a elite dominante brasileira aprofundou os seus esforços para minar ainda mais o monitoramento da pandemia no Brasil. Depois de o sistema de monitoramento da pandemia do ministério da saúde ficar fora do ar por um mês até meados de janeiro em função de um suposto ataque hacker, a já escassa quantidade de testes realizados caiu enormemente, passando de 929 mil em fevereiro para 264 mil em março deste ano. Em outubro, foram realizados quase 77 mil testes, a menor quantidade desde março de 2020.

Resumindo a situação brasileira, o renomado neurocientista Miguel Nicolelis tuitou em 18 de novembro: “Não resta qualquer dúvida: estamos surfando uma nova onda de COVID19, sem timoneiro, sem rumo, sem bússola, e sem nenhuma estratégia de curto, médio e longo prazo para combater uma pandemia QUE AINDA Ñ ACABOU!”. Desde o início da pandemia, Nicolelis tem sido um dos críticos mais ferrenhos da política de “viver com o vírus” e seus efeitos, como a COVID longa, não apenas do governo Bolsonaro, mas também da suposta oposição representada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) nos quatro estados do Nordeste que governa.

Ao contrário dos alertas de Nicolelis, os especialistas escolhidos a dedo pela mídia corporativa têm ressaltado que não há nada a temer com esta nova onda, sugerindo que alguns grupos sociais, como idosos e pessoas com comorbidades, voltem a usar máscaras e reforçando a necessidade de se vacinar. Ao mesmo tempo, eles têm colocado a responsabilidade desta nova onda na propagação da BQ.1 e outras subvariantes mais infecciosas já detectadas no Brasil, ignorando totalmente o completo abandono de todas as medidas de mitigação, incluindo em escolas e no transporte público. Praticamente nenhuma cidade brasileira voltou a obrigar o uso de máscaras.

Também foi completamente ignorado pela mídia o papel das eleições gerais de 3 de outubro, quando muitos dos mais de 120 milhões de eleitores passaram horas nas filas em locais de votação sem a ventilação adequada e sem a obrigatoriedade do uso de máscaras. Em novembro de 2020, a eleição municipal já havia se mostrado um evento superpropagador, impulsionando a propagação da variante Gama que no início de 2021 levou à segunda onda mortal da pandemia.

Essa nova onda no Brasil está acontecendo em meio ao contínuo esforço do governo Bolsonaro de minar a vacinação no Brasil. A sabotagem da vacinação é parte integrante de sua política de “imunidade de rebanho” ao minimizar os perigos da COVID-19 e deixar o novo coronavírus infectar o maior número de pessoas. Ela também possui o objetivo de mobilizar um movimento fascistoide no Brasil.

Assim que as vacinas contra a COVID-19 se mostraram eficazes e seguras, no final de 2020, Bolsonaro iniciou um virulento ataque contra a eficácia das vacinas e atrasou deliberadamente sua compra. Para o ano que vem, a área da saúde mais atingida pela proposta orçamentária do governo Bolsonaro é o programa de imunização federal, que teve uma redução de 37% e ameaça o único controle ainda restante contra a pandemia no Brasil e o retorno de inúmeras doenças infecciosas. Também apenas para 2023 está previsto o oferecimento de vacinas bivalentes adaptadas contra as subvariantes da Ômicron BA.4 e BA.5, da qual surgiu a BQ.1.

Os constantes ataques de Bolsonaro e seus aliados fascistoides à vacinação assumiram um caráter ainda mais criminoso a partir do final do ano passado, quando a Anvisa aprovou em 16 de dezembro de 2021 a vacina da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos. Junto com uma completa ausência de campanhas de vacinação, os ataques contra a aprovação de vacinas infantis têm feito com que a taxa de vacinação entre as crianças brasileiras se mantenha criticamente baixa.

Segundo uma reportagem da Folha de S. Paulo de 7 de novembro, a taxa de vacinação para crianças de 3 e 4 anos, que começaram a ser imunizadas em agosto com a vacina da CoronaVac, é de apenas 13,9%, e não de 40% como o ministério da saúde havia divulgado no final de outubro. A vacinação dessa faixa etária ainda tem sofrido uma série de problemas, com pelo menos sete capitais no Brasil tendo que suspender a vacinação por falta de doses na semana passada. Em algumas delas, a suspensão já dura três semanas.

Já a vacina da Pfizer para bebês e crianças entre 6 e meses e quatro anos foi aprovada pela Anvisa em 16 de setembro. Apenas na última quinta-feira, 17 de novembro, começou a aplicação da vacina, mas apenas para crianças com comorbidades. Essa decisão do governo contrariou não apenas a Anvisa, mas a própria câmara técnica de assessoramento de imunização do ministério da saúde, que foi acionada desnecessariamente e deliberadamente apenas para atrasar ainda mais o início da vacinação.

Em 16 de novembro, as Sociedades Brasileiras de Pediatria e de Imunizações divulgaram alerta solicitando, “enfaticamente, do Ministério da Saúde, a imediata inclusão no Programa Nacional de Imunizações, de vacinas Covid-19 para todas as crianças a partir de 6 meses de idade... O atraso no início da vacinação, de forma inexplicável, continua, especialmente em momentos de aumento de circulação viral.”

Comentando ainda a decisão do governo federal de vacinar apenas crianças com comorbidades, o infectologista da Fiocruz Julio Croda disse ao g1: “não existe lógica nisso, pois metade dos nossos óbitos nessa faixa etária ocorreram em crianças que não tinha comorbidade.”

De fato, o resultado dessa política equivale a um crime bárbaro contra as crianças, o grupo social mais vulnerável e que deveria estar mais protegido. Em 2021 e 2022, 1.508 crianças menores de 5 anos morreram de COVID-19. Quase a metade dessas mortes aconteceram em bebês de até um ano de idade. Este ano, 454 crianças menores de 5 anos de idade haviam morrido por COVID-19 até outubro.

Apesar de Bolsonaro representar a face mais cruel da política de “imunidade de rebanho”, ela foi abraçada por todo o establishment político brasileiro, incluindo o PT. Durante a campanha eleitoral presidencial, o papel do PT e seu candidato eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, em relação à pandemia foi completamente exposto.

Um estudo publicado em 24 de outubro pela Rede de Pesquisa Solidária em Políticas Públicas e Sociedade, composta por pesquisadores das maiores universidades do Brasil, mostrou que os planos de governo tanto de Lula quanto de Bolsonaro: “não informam programas abrangentes para o controle da COVID-19 no território brasileiro”; não mostram como o Brasil pode “preparar uma estrutura que possa ser acionada em momentos de crises sanitárias” futuras; “há ausência completa de ações voltadas para melhoria da estrutura da vigilância epidemiológica”; e não fazem referências à “vacinação contra COVID-19.”

Isso mostra que sob o governo do PT a partir do ano que vem, o novo coronavírus continuará se espalhando de maneira descontrolada pelo Brasil, com a ameaça ainda mais grave de novas variantes de preocupação surgirem e estender a pandemia anos a fio, com devastadores consequências para a população brasileira e mundial.

Essa perspectiva reforça o chamado do Comitê de Base pela Educação Segura no Brasil, que faz parte da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base, para que professores e toda a classe trabalhadora brasileira lutem pela implementação da estratégia de eliminação global da COVID-19 em aliança com os trabalhadores de todo o mundo e consigam colocar de vez um fim a todo o sofrimento causado pela pandemia.

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