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UNE e CNTE encobrem ataques do governo Lula à educação

Depois de no ano passado a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) terem sabotado e desviado as inúmeras lutas contra os ataques do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro à educação em direção à eleição do então candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) Luiz Inácio Lula da Silva, hoje elas estão encobrindo as sucessivas medidas de austeridade do novo governo do PT.

Estudantes brasileiros protestando contra os cortes na educação do governo Lula em Brasília na sexta-feira da semana passada. [Photo: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil]

Agora que Lula chegou ao poder e está dando continuidade aos ataques capitalistas à educação, essas organizações nacionalistas e corporativistas querem impedir que a juventude e os trabalhadores brasileiros tirem as lições necessárias do histórico dos governos do PT, que hoje está presidindo um país marcado por níveis de desigualdade social crescentes em meio a uma situação internacional explosiva, e desviar suas lutas de um confronto direto com o Estado capitalista.

No final de julho, o governo Lula anunciou um corte de 1,5 bilhão de reais (300 milhões de dólares) do orçamento federal, que teve como os setores mais atingidos a saúde e a educação.

Tentando esconder a responsabilidade do governo Lula por esses ataques, a UNE e outras organizações estudantis, controladas pelo maoísta Partido Comunista do Brasil (PCdoB), pelo pseudoesquerdista Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e pelo próprio PT, foram obrigadas a chamar uma manifestação na sexta-feira da semana passada.

Segundo um tuite da UNE, “Governo Federal bloqueia verba para alfabetização, transporte escolar e bolsas de estudo... No dia 11 de agosto, sairemos às ruas de todo o Brasil para que o orçamento da pasta seja imediatamente reconstituído. Educação é investimento!” Ela ainda escreveu que o “bloqueio orçamentário [foi] herdado pela política nefasta do governo Michel Temer [2016-2018], que instituiu um teto de gastos para a educação brasileira.”

Não poderia haver alegação mais fraudulenta. Ignorando a responsabilidade do governo Lula pelo corte, a UNE conscientemente omitiu o fato de ele conseguir aprovar em maio na Câmara dos Deputados seu próprio “arcabouço fiscal”, que também limita os gastos sociais e em educação e contou com o voto favorável de todos os deputados do PT.

De acordo com a intenção da UNE em blindar o governo Lula, o que se viu na sexta-feira da semana passada foram atos limitados tanto em relação ao número de participantes quanto politicamente. Um dos diretores da UNE, Luis Alves, disse à Agência Brasil que se tratou de “um ato simbólico” para apresentar “uma reinvindicação ao governo” e “ter uma ‘reconstrução do Brasil’ de fato”, uma referência ao slogan do governo Lula.

O esforço para isolar a luta dos estudantes e limitar os atos contra os cortes do governo Lula, assim como pela revogação da reforma pró-corporativa do Ensino Médio, uma demanda crescente de estudantes e professores, foi visto claramente em São Paulo.

Na maior cidade brasileira, a UNE e outras organizações estudantis marcaram a manifestação para às 8 horas da manhã. A intenção consciente delas foi impedir que a manifestação se massificasse em um momento em que os professores da rede pública estadual estão sofrendo uma série de ataques do governador Tarcísio de Freitas e professores de escolas e faculdades técnicas de São Paulo estão em greve.

A sabotagem da UNE tem sido acompanhada pelos sindicatos de professores controlados pelo PT e seus apologistas pseudoesquerdistas e pela CNTE, filiada à CUT, a central sindical controlada pelo PT. Eles continuam isolando greves e impedindo uma luta unificada nacionalmente, inclusive com os estudantes.

Neste segundo semestre, os professores de inúmeras redes de ensino municipais e estaduais têm continuado o movimento de greves e paralisações iniciado no início deste ano pelo cumprimento do piso nacional da educação e contra a reforma do Ensino Médio. Apenas na semana passada, logo após o início do semestre letivo, professores da Paraíba e Alagoas entraram em greve. Na Bahia, governada há 17 anos pelo PT e que nos últimos dias foi destaque nacional por possuir a polícia militar mais letal do Brasil, os professores realizaram uma manifestação na terça-feira da semana passada em frente à Assembleia Legislativa Estadual e ameaçam entrar em greve a qualquer momento.

Ao invés de chamar uma greve geral e manifestações em todos os estados brasileiros unificando professores e estudantes, a CNTE convocou um ato de “abraço de pressão” no Ministério da Educação em 9 de agosto, dois dias antes da manifestação da UNE. Sem mencionar os cortes do governo Lula na educação, a CNTE escreveu em seu site que o ato “visa pressionar os poderes Executivo e Legislativo por mais qualidade no setor e pela valorização da educação pública e de seus profissionais.”

A manifestação da CNTE foi também convocada para coincidir com o anúncio pelo governo Lula de alterações na reforma do Ensino Médio. Em abril, ele tinha suspendido seu cronograma de implementação e iniciado uma consulta pública com professores e estudantes. Como foi amplamente reconhecido, segundo a Folha de S. Paulo, “o ato foi uma forma de reduzir o desgaste do governo com o tema”, uma vez que “o discurso do ministro da Educação, Camilo Santana (PT), sempre foi no sentido de fazer ajustes e não revogar” a reforma.

Desde que assumiu o cargo, Santana encheu o Ministério da Educação de representantes de fundações educacionais ligadas a grandes bancos e empresas que estiveram por trás da reforma do Ensino Médio. A principal alteração proposta pelo governo Lula foi o aumento das horas das disciplinas regulares em detrimento daquelas ligadas ao mercado de trabalho, o que foi saudado pelo Todos pela Educação, a maior fundação educacional pró-corporativa brasileira.

Segundo ele, “as propostas do MEC [Ministério da Educação] apontam na direção correta, uma vez que buscam realizar ajustes e aprimoramentos na formulação original, preservando os princípios da reforma efetivada em 2017 ... como a expansão da carga horária, a flexibilização curricular e maior articulação do Ensino Médio com a Educação Profissional e Tecnológica. Este é um destaque importante diante dos pedidos por revogação que marcaram o debate público nos últimos meses.”

O caráter pró-corporativo do Ministério da Educação do governo Lula também se expressou numa lei que sancionou no final de julho estabelecendo o Programa Escola em Tempo Integral. Além de aumentar o tempo dos alunos brasileiros nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, seu objetivo é estender a todo o Brasil os modelos pró-corporativos na educação baseados na “meritocracia, estímulo fiscal, com premiação, onde as escolas passam a ter metas e indicadores”, como Santana o definiu no final do ano passado e que aplicou enquanto governador do Ceará entre 2015 e 2022.

A atuação farsesca da CNTE, da UNE e de outros sindicatos de professores e organizações estudantis foi acompanhada pelo silêncio completo de boa parte da pseudoesquerda brasileira em relação aos ataques recentes do governo Lula à educação, como o Esquerda Online, publicado pela organização morenista do PSOL Resistência, e o Diário Causa Operária, do lambertista Partido da Causa Operária (PCO).

Já o morenista Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), a organização irmã no Brasil do argentino Partido dos Trabalhadores Socialistas (PTS), está se apresentando como uma “alternativa” política de esquerda e defendendo uma suposta “luta independente” em relação ao PT e ao governo Lula. Porém, isso é exposto por sua tentativa de oferecer uma cobertura de esquerda à CUT e aos sindicatos brasileiros controlados pelo PT e o PSOL, alegando que eles podem ser pressionados a defender os interesses da juventude, dos professores e dos trabalhadores no Brasil.

Desde o final do ano passado, essa tentativa falida do MRT foi ainda mais exposta em sua aliança com a mãe das organizações morenistas no Brasil e de onde ele próprio saiu, o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU). O histórico direitista do PSTU – desde o apoio ao impeachment fraudulento da ex-presidente pelo PT Dilma Rousseff, passando pelo apoio à “resistência ucraniana” na guerra dos EUA/OTAN contra a Rússia na Ucrânia até as inúmeras alianças que o PSTU tem realizado nos sindicatos com o PT e o PSOL – está longe de ser um impedimento para o MRT avançar sua política oportunista ao tentar forjar uma versão brasileira da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores – Unidade (FIT-U) da Argentina.

Como os recentes eventos no Brasil mostraram, o que está impedindo o desenvolvimento da luta dos professores e estudantes em defesa da educação pública são os sindicatos nacionalistas e pró-corporativos. Ao contrário do que alega organizações como o MRT, que representam seções do aparato sindical de classe média, não há nada o que reformar nessas organizações.

O genuíno caminho a seguir na luta pela independência política da classe trabalhadora só será trilhado através da ruptura consciente com essas organizações controladas pelo PT e seus apologistas da pseudoesquerda através da formação de uma rede internacional democrática de comitês de base. Isso significa construir a Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB), lançada em 2021 pelo Comitê Internacional da Quarta Internacional, para liberar a enorme força social da classe trabalhadora no Brasil e internacionalmente em uma luta coordenada contra o sistema capitalista e seus representantes, incluindo o PT.

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