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O fraudulento “fim da pandemia” do governo Bolsonaro

Em 17 de abril, o governo do presidente fascistoide, Jair Bolsonaro, anunciou o fim do estado de emergência sanitária iniciado em fevereiro de 2020, oficializando a campanha pelo fim das restrições de controle da pandemia de COVID-19 no Brasil.

Em um discurso em rede nacional, após admitir que o mundo ainda “enfrenta a maior emergência sanitária da história” e fingir lamentar “as vítimas e aquelas que ainda sofrem em decorrência das sequelas dessa doença”, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, hipocritamente declarou que “com a força do Sistema Único de Saúde (SUS), salvamos muitas vidas”.

Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, em maio de 2021 (Wikimedia Commons)

As implicações criminosas do novo decreto do governo Bolsonaro foram levantadas pela epidemiologista Ethel Maciel numa discussão organizada pelo Observatório COVID-19 da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Maciel declarou: “Precisamos fortalecer a capacidade das equipes epidemiológicas e dos laboratórios. A grande preocupação com a revogação do decreto [de emergência de saúde] é que essas estruturas sejam fechadas”.

Combinada à desobrigação do uso de máscaras em todos os estados brasileiros e a predominância da subvariante BA.2 da Ômicron no Brasil, a decisão do governo brasileiro de acabar com a emergência sanitária poderá impulsionar um novo surto, como está acontecendo nos EUA e no Reino Unido.

Em 14 de abril, o Instituto Todos pela Saúde (ITpS) divulgou que a subvariante altamente transmissiva BA.2 correspondia a quase 70% dos casos de COVID-19. Há menos de um mês, em 19 de março, 27,2% dos testes positivos eram provenientes da subvariante.

Diante disso, diversos cientistas e especialistas em saúde apontaram preocupações sobre as implicações do fim do decreto de emergência.

No dia 7, foi confirmado que o Instituto Butantan encontrou o primeiro caso da subvariante XE da Ômicron, que combina características da BA.1 e da BA.2. No dia 16, foi confirmado o primeiro caso de recombinação das variantes Delta e Ômicron no Brasil no estado do Rio Grande do Sul. Richard Steiner Salvato, especialista da agência de vigilância genômica do estado, declarou a importância de continuar acompanhando a trajetória dessas variantes. Salvato afirmou: “O caso identificado aqui possui mutações adicionais, o que não permite conhecer bem quais impactos essa recombinação traz ao comportamento do vírus”.

Nésio Fernandes, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), disse à revista Piauí: “Com o corte e a descontinuidade desse financiamento, haverá uma grande desmobilização de leitos de UTI”. Segundo ele, o sistema de saúde nacional não entrou em colapso em fevereiro, durante a onda da Ômicron, porque manteve esses leitos que agora serão desmobilizados.

A epidemiologista Marcia Castro, da Universidade de Harvard, ressaltou à Piauí a grande desigualdade regional de vacinação e o fato de que menos de 40% da população brasileira tomou a dose de reforço: “Ainda temos muita gente não vacinada, o número de casos está aumentando na Europa, temos ambientes cujas condições de ventilação são péssimas. Essa mensagem do ‘acabou’ é muito preocupante”.

A campanha das classes dominantes para desmobilizar todos os esforços contra a pandemia se baseia na narrativa de que, após repetidas ondas do SARS-CoV-2 e do espalhamento da supostamente “leve” variante Ômicron, a pandemia estaria se tornando uma “endemia”. O termo tem sido usado por governos ao redor do mundo enquanto declaram o fim de todas as medidas de controle da pandemia e cortam os recursos necessários para realizar o tratamento de pacientes com COVID-19.

Um elemento crítico dessa política de “imunidade de rebanho” é o corte do financiamento de centros de testagem, efetivamente eliminando a capacidade de prever a trajetória do vírus e preparar qualquer tipo de resposta, mas também escondendo da população a real gravidade da pandemia.

Nos Estados Unidos, onde a obrigatoriedade do uso de máscaras no transporte público foi abandonada na semana passada, o governo Biden cortou o financiamento de testes e vacinas para pessoas sem seguro de saúde enquanto critérios são inventados para remover dezenas de milhares de mortes da contagem do CDC, a agência americana de controle de doenças.

No Reino Unido, o governo de Boris Johnson pôs fim à distribuição gratuita de testes no início deste mês, além de outras medidas críticas no combate ao vírus terem sido descartadas desde 24 de fevereiro, como a exigência de autoisolamento para pessoas com testes positivos. O real impacto da BA.2 no país está sendo verificado no número quase recorde de internações e nas quase 2.300 mortes na última semana.

No Brasil, em 10 de dezembro, após um ataque hacker contra o site do ministério da Saúde derrubar a contagem de novos casos, óbitos e vacinações, Bolsonaro redobrou sua ofensiva contra quaisquer medidas de mitigação restantes e contra a implementação de certificados de vacinação para controlar a entrada de pessoas de fora do país antes das festas de final de ano e de carnaval.

Em dezembro, com a iminente aprovação da vacinação de crianças de 5 a 11 anos, Bolsonaro incitou a violência contra técnicos da Anvisa, responsável pela decisão, enquanto ameaçou obrigar pais a obterem uma receita médica para vacinar seus filhos. O governo Bolsonaro atrasou a campanha de vacinação infantil durante semanas, enquanto os governadores, incluindo os da autodeclarada esquerda, declararam em coro que não adiariam o retorno das aulas presenciais obrigatórias.

Após o arrefecimento da onda da variante Ômicron em janeiro/fevereiro, os governadores pressionaram pelo fim da obrigatoriedade das máscaras, somando-se aos esforços de Bolsonaro.

Diante da campanha pelo fim de todas as medidas de controle do espalhamento do vírus e do anúncio do fim da emergência sanitária, o significado da narrativa da “endemia” se torna claro: a população deve aceitar um “novo normal” de massivas infecções, mortes, e sofrimento com a COVID longa.

O governo Bolsonaro e os governadores de todos os partidos políticos representam os interesses da burguesia brasileira, que vê na preservação das mínimas medidas de mitigação uma lembrança indesejada de que a pandemia não acabou. Seu objetivo é garantir que os trabalhadores permaneçam nos locais de trabalho, mesmo infectados, para maximizar os lucros das grandes empresas.

É necessário se opor a essas medidas, que não possuem nenhuma base científica. A história dos últimos dois anos mostra que a infecção em larga escala arrisca o surgimento de novas variantes com escape vacinal e agressividade cada vez maiores. A pandemia de COVID-19 não irá terminar por decreto, mas apenas através de uma política de eliminação global do coronavírus.

As ações dos governadores do Partido dos Trabalhadores (PT), que ao lado de Bolsonaro levaram adiante a reabertura insegura da economia e das escolas, mostram que um eventual novo governo de Lula não é uma alternativa para lutar contra a pandemia e de nenhum dos problemas urgentes que confrontam a classe trabalhadora no Brasil.

Em abril de 2020, enquanto Bolsonaro reafirmava que nenhuma resposta de saúde pública deveria ser implementada, o Congresso aprovou com o apoio de todos os partidos, incluindo da bancada do PT, um pacote de centenas de bilhões para proteger as grandes empresas do impacto econômico da pandemia, enquanto uma fração desse valor foi aprovada para fornecer auxílio emergencial aos trabalhadores somente por alguns meses.

Em contraposição à política de morte dos governos capitalistas ao redor do mundo, a classe trabalhadora deve se organizar em comitês de base, como parte da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB), com a colaboração de cientistas e especialistas em saúde pública para implementar todas as medidas necessárias para pôr fim à pandemia.

Em 1º de maio, o Comitê Internacional da Quarta Internacional apresentará um programa para contrapor a estratégia de guerra e morte da classe dominante com um programa para a eliminação da pandemia e pôr fim à guerra imperialista que está sendo travada na Ucrânia. Chamamos todos os trabalhadores no Brasil e internacionalmente para que participem desse crítico evento.

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